Hoje é o Dia do Orgulho Autista. E, por mais que a gente deseje celebrar a identidade, a força da pessoa autista, é impossível não olhar para o cenário atual e sentir dor, indignação e cansaço.
É impossível falar de orgulho quando o que mais nos atravessa é a negligência.
Pessoas autistas do nível 1 de suporte, que aparentemente "não precisam de ajuda".
estão adoecendo em silêncio.Carregam comorbidades como ansiedade, depressão e burnout.
Estão em ambientes acadêmicos, profissionais e sociais onde não há qualquer adaptação - e onde tem cobrança o tempo todo para performarem uma normalidade que fere, cansa e sufoca.
Muitos tiram a própria vida. E o mais assustador é que não há dados exatos. Porque ninguém está contando.Porque ninguém está olhando.
Pessoas autistas do nível 2 de suporte seguem sendo empurradas para dentro de escolas
e atendimentos generalistas, onde o suporte oferecido é raso, sem planejamento individualizado, sem visualização especializada, sem escuta verdadeira. Famílias que gritam por apoio e ouvem como resposta o silêncio do sistema.
E o nível 3, que mais exige presença, preparo e estrutura, é o mais desacreditado.
Crianças e adultos com autismo severo têm seus direitos negados diariamente. Profissionais se negam a atendê-los.
Escolas negam matrícula. Clínicas recusam o desafio. Tudo porque falta preparo - mas acima de tudo, falta humanidade. Falta empatia, falta política pública. Falta dignidade.
O que uma pessoa autista precisa para viver com qualidade vai muito além do que se oferece hoje, sim, custa caro para o Estado. Mas é um custo que revela o quanto ainda estamos longe do que se pode chamar de inclusão real.
Precisamos de capacitação nas escolas, acesso garantido às horas terapêuticas recomendadas, profissionais especializados, médicos comprometidos,alimentação adaptada, suporte visual, comunicação alternativa, e acima de tudo: respeito.Mas a realidade é dura. No nosso país, não temos o básico. Não temos adaptação.
Não temos comunicação pública de qualidade explicando o que é o autismo, o que são os níveis de suporte, o que cada pessoa precisa. Não temos preparo para o mercado de trabalho, nem estrutura nas universidades, nem apoio contínuo nas unidades básicas de saúde.
O caso recente da jovem autista de 19 anos, que teve 17 dentes arrancados sem autorização em um centro que se propõe a ser referência em inclusão, mostra o abismo em que vivemos. Se em um centro especializado a violência acontece.
Imagine nos locais sem qualquer preparo. E esse é apenas um caso que ganhou visibilidade. Quantos outros não chegam a ser noticiados? Esse é o nosso desespero. Nossa angústia. Saber que ser autista no Brasil ainda é um risco.
Saber que ser família atípica ainda é sinônimo de luta constante contra o descaso.
Por isso, neste Dia do Orgulho Autista, o que eu tenho não é um convite à comemoração, mas à consciência.Orgulho não é negar a dor.Orgulho é existir apesar de tudo.É continuar resistindo todos os dias num país que ainda não aprendeu a respeitar o que é diferente.
Danielle Farias
Mãe Atípica
Fundadora do Instituto Acreditar
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